Arquivo de Tag | Literatura baiana

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pilhas de trabalho sobre a mesa
amordaçando dores.

para ouvidos cegos
sentir caiu em desuso
melhor mesmo é produzir.
  
felicidade:
cinco publicações em periódico
de excelência.
  
chove no meu escritório.
a água devora os papéis
abre caminhos.
  
deixa um rastro de vida
que acompanho
contemplando o Sol
que vai nascer.
Lílian Almeida 
Foto de Ithalu Dominguez no Pexels

De zero a dez

Há dias eu pensava sobre a intensidade da dor, como mensurá-la e expressá-la para quem não a sente. Era um exercício de autopercepção e de expressão. Isso me instigava no desafio de traduzir em palavra o que sentia e levar ao outro o que foi sentido. Ofício de quem escreve, não é? Pois, me parecia um bom exercício, esse, de traduzir a intensidade da dor.

O primeiro disparo veio na pergunta “qual a intensidade da dor?”. Eu fiquei sem saber responder, falei que era forte e a medida foi sugerida. “De zero a 10, quanto?” Ainda me detive uns minutos para responder um três, àquele momento. Passaram dias desse diálogo entre paciente e osteopata. E eu fiquei com o de zero a dez na cabeça. O que era pra mim uma dor na intensidade 10? Suportaria mais do que a intensidade que qualifiquei de cinco? Eu não sabia. Sabia apenas que doía e que não era bom sentir o desconforto físico que me visitava fazia tempo.

Foto de Evelyn Chong no Pexels

Não me apraz esse tipo de visita, gera incômodos. Como gosto de ler as coisas, inclusive os sinais do meu corpo, me questionei por anos sobre o motivo da volta indesejada da dor. Caminhos vários percorri, entendi somatizações, padrões, comportamentos vários que eram porta aberta para a companhia dolorosa. Todos foram importantes, reconheço. E se ainda não curei de vez a dor, curei vários mecanismos de atuação na vida que geram desconforto físico ou, se não, tomei consciência de muita coisa em mim que a atraía.

Em várias portas bati, desde tratamento espiritual a ortopedista, cada um trouxe sua cota de contribuição, mas ela continuava dando as caras vez em quando. Resolvi que iria por um caminho novo pra mim, afeita que sou à possibilidade de ter uma perspectiva diferente sobre o já dito. Ia procurar um osteopata para um diagnóstico e tratamento, era uma das minhas metas para 2020. A pandemia chegou, ilhou todo mundo em casa e vi meu propósito de autocuidado escorrer pelos meses. O tempo ia passando, eu via o plano ficar distante. Até que um dia, numa conversa com uma amiga, surgiu o osteopata. Estava dado o sinal, a abertura para a possibilidade de implementar o cuidado. A essa altura o confinamento começava a ser flexibilizado. Deixei passar uns dias, amadurecendo a possibilidade, e marquei a consulta.

Foi lá, no primeiro atendimento, que fui confrontada com o desafio de traduzir a intensidade da dor, com uma régua de zero a dez. O tratamento ia avançando, o desconforto reduzindo e a pergunta volta e meia me rondava. “De zero a dez, quanto?” O que era uma dor nota 10? Com anos de convivência, tornei-me resiliente e resistente à dor. Suportava-a tentando diálogo, mesmo quando ia às lágrimas. Confesso que não sei se as lágrimas eram de dor ou de impotência, outro tipo de dor, que dói além físico.

Nas sessões de tratamento osteopático minha maior intensidade expressada era o cinco. E já era muito pra mim. Sempre, depois da resposta, me perguntava em silêncio. O que é uma dor dez? Aguentaria eu mais do que já estou aguentando? Quanto mais precisa doer pra chegar a 9 ou 10? Já não é o bastante para caber nessa quantificação? Estou superestimando minha capacidade de resistir à dor? Subestimando a intensidade do doer?

Os dias foram passando e a visita, que pensei ter ido embora definitivamente, voltou com disposição. Senti bastante dor, tive alguns movimentos comprometidos e também a possibilidade de receber cuidado profissional num curto espaço de tempo. “Dói?” “Dói”. “Quanto?” “Muito.” “De zero a dez, quanto?” “Cinco, seis… o que é uma dor nota dez?” Não tive resposta. Doía muito e era o bastante. Cinco era igual a dez na matemática dolorida do meu corpo. Finalmente consegui resolver o impasse.

Lílian Almeida

O homem que brigou com o vento

No caso, o homem sou eu mesmo. E a culpa é fácil dizer… é do vento! Aconteceu o seguinte: desde que resolvi dar um tapa no visual da casa e instalar um forro no teto, a coisa toda ficou estranha. A casa, é verdade, ficou mais bonitinha, mas eu não fazia ideia de que, com esse simples movimento de renovação da parte de cima e interna do lar, estaria eu criando um novo mundo.

Pequenos apocalipses sobre minha cabeça. Defini primeiro assim. Depois comecei a andar com passos de detetive pelos cômodos, as mãos para trás, como imagino ser o gesto atemporal dos filósofos, perscrutando tudo que estava acima de mim e, supunha, no entrelugar da casa. Invisíveis criaturas ressuscitando o Axé no meu telhado? Invasão de um exército alienígena, cujas armas são perturbações sônicas? Castigo divino pelo meu ateísmo? A conclusão veio num sopro: eu estava aborrecido, três dias sem dormir, ou melhor, despertado em intervalos na madrugada pelas trombetas do além.

Tinha que fazer algo. Instalei a escada e subi no telhado. Tarefa complicada. Logo me vi imitando Tom Cruise na famosa cena do filme Missão Impossível. Braços estendidos me transformando na cruz de minha própria penitência. Eu fui arrumar o problema e quase que arrumo mesmo um problema. Com o peso de minha mão, o telhado estalou e uma rachadura surgiu. Recuei. Veja só a falta de efeitos especiais hollywoodianos na vida prática de uma pessoa.

Embora meu pai tenha me treinado desde a infância para dominar as técnicas de resolução de qualquer problema futuro de engenharia civil amadora (não sou um engenheiro civil formado, sou apenas cidadão), sinto que o decepcionei, pois mal consigo fixar um prego na parede sem sair com avarias no meu próprio corpo.

Para mim, era difícil aceitar que o ar atmosférico que se desloca naturalmente, seguindo determinada direção, estivesse simplesmente agindo conforme seus movimentos de existência. Cada lufada sacudia o meu juízo em busca de meios para deixar de sentir o vento forte e prolongado que produzia um universo musical distante do meu gosto.

Prosseguia combativo.

Um amigo que entende de telhados me disse: Faça isso, isso e isso. E então eu fiz isso, isso e isso. Nada. Rimara, minha companheira, mais resignada, me falava: Não brigue com o vento, amor. Não tem jeito. Vamos nos adaptar. Aquela paciência de Monja Coen me deixava mais agitado do que a própria corrente de ar que me atormentava. Tá certo, eu dizia. Mesmo sabendo que, para mim, não estava nada certo. Longe disso. Por outro lado, nosso contraste diante do problema me revelava: o mundo não tem só a forma de si mesmo, tem também um pouco da nossa forma, e esse nosso jeito de ver as coisas negocia com a forma do mundo.

Depois das inúmeras tentativas que, para mim, resultaram falhas, minha companheira me diz pela milésima vez: Melhorou, amor. Relaxe. E eu, contrariando a regra de sempre ouvi-la (ela quase sempre tem razão), ainda às voltas com possíveis resoluções definitivas contra o vento malévolo, me agarro a essa verdade, que só ela acredita: É, melhorou.

Evanilton Gonçalves (autor de Coisas que desaprendi com o tempo. Texto publicado originalmente no Jornal A Tarde, 08/09/2020)

Imagem de OpenClipart-Vectors por Pixabay 

O lobo mau

Eu vi o lobo mau.
Foi? Quando?
De noite.
De noite? Na floresta?
Não, em meu quarto.
Puxa! E aí?
Ele estava conversando com Chapeuzinho e depois saiu na carreira.
Foi pra casa da Vovozinha.
É.
E então? O que é que você fez?
Eu também fui.
Foi? E quando chegou lá?
O lobo disse: Abra a porta, sua Vovó!
E ela abriu.
Não. Não abro, não abro. Pois eu vou soprar. E derrubou a casa da Vovó.
Foi?
E comeu a Vovó.
Inteirinha?
É. Só tirou o vestido dela, pra não engasgar.
Ahn! E Chapeuzinho?
Chapeuzinho ficou se balançando na rede.
Na rede?
Na varanda.
Na varanda da casa? Mas o lobo não havia derrubado a casa com um sopro?
Foi.
E pode isso?
Ah, pai, você não entende nada. As pessoas grandes acreditam em tudo!

Antonio Brasileiro (“O menino no guarda-roupa”)

Imagem de 
Mauro Borghesi do 
Pixabay 

Estátua!

Às vezes me sinto um solitário à espreita, tentando capturar o exato momento em que tudo seja mais simples. Agora mesmo penso na época em que alguém colocava uma música animada enquanto eu e minha turma dançávamos como se não houvesse amanhã até que havia a pausa e tínhamos que congelar ao comando de: ESTÁTUA! Não lembro de sair vencedor nessas brincadeiras. Pouco importa. A linha do tempo me diz que o essencial é a alegria compartilhada, o riso solto, a felicidade de estar no mundo com pessoas felizes ao redor.

Quando nos encarávamos naquela simulação de imobilidade total, éramos pequenas figuras de carne e osso, com uma historinha iniciada e o anseio de fazer os outros olharem para nós com atenção sem igual. A música tocava outra vez e então outra vez nos movíamos com alegria no mundo. Sinto falta daquele sorriso fácil. Cresci um tanto indiferente às figuras esculpidas em mármore ou fundidas em metal que servem, eu sabia apenas, como banheiros para as aves que socializam nas praças.

Acontece que fui aprendendo, pouco a pouco, sobre o fato de, muitas vezes, a História oficial ser a narrativa dos vencedores, que pode ser entendida por vitória de mercenários, escravocratas, genocidas, carrascos, assassinos, sequestradores, torturadores e toda uma leva de gente má, fantasiada de cidadão de bem, que pisou na terra para espalhar dor e fazer uma criminosa fortuna com a exploração alheia. Não há virtude na exploração. Mas essas pessoas estão aí, soltas pela cidade, em seus pontos fixos de existência macabra. Só falta inventarem uma agência de turismo que guie as pessoas por esses lugares onde os meliantes históricos habitam:

— Bem, pessoal. Esse aqui é mais um que construiu uma reputação positiva pra si e contou com ajuda de cúmplices pra esconder suas falcatruas. Sim, sim, no fim da vida, esse também fez vultuosas doações pra caridade, o que, como já sabemos, lhe garantiu estadia aqui e, supostamente, uma outra no condomínio celestial tão disputado.

Ao olhar com mais atenção a materialização da cidade onde meu corpo habita, é assustador ver as homenagens que a História oficial me oferece. A cada esquina, um desvario petrificado me expõe ao terror de sua existência. Enquanto, cada vez mais, pessoas se unem contra o racismo estrutural, em prol do bem-estar coletivo, tem quem fique inconformado com a possibilidade de remoção e realocação museológica de certas estátuas e ache injusto deixar de prestar homenagem a pessoas cuja grandeza foi nos legar um rastro de sangue e sofrimento.

Como explicou o professor, jurista e filósofo Silvio Almeida em participação memorável no programa Roda Viva: “Se você tem um monumento dentro da cidade, é uma indicação de quem você quer que esteja ali, a quem você faz reverência naquele espaço”. Não é estranho que bandidos históricos tenham lugar de honra em nossa cidade? Se olharmos com atenção certos nomes de ruas ou as instalações de figuras tridimensionais expostas em terras brasileiras, o susto é garantido, o constrangimento também deveria ser.

Evanilton Gonçalves é autor de Pensamentos supérfluos: coisas que desaprendi com o mundo (Paralelo13S). A crônica acima foi publicada no Jornal A Tarde do dia 09/09/2020.

Imagem de Wildschuetz por Pixabay 

A quem confiar minha tristeza?

Li há anos um conto do escritor Anton Tchekhov que não me saiu da cabeça. Chama-se Angústia. A breve narrativa começa com o cocheiro Potapov, uma espécie de taxista em nossos tempos, coberto de neve, imóvel em seu veículo, enquanto aguarda passageiros para transportar de um lado a outro da cidade. Talvez se pudesse pensar a mesma cena friorenta aqui em terras nordestinas, se levarmos em conta a metamorfose geográfica aplicada pela pessoa que ocupa o cargo de ministro interino da Saúde de nosso País.

Em síntese, é o seguinte: Potapov sofre pela recente morte de seu filho. Em meio à tristeza, tenta desabafar sobre sua perda com as pessoas que ele transporta ou encontra pelo caminho, mas ninguém lhe dá ouvidos. Gente de diferentes classes sociais, de militar a cocheiro como ele, ignora a dor do trabalhador . Potapov segue, mesmo em evidente estado melancólico, na labuta, com o coração em pedaços. Após o insucesso nas tentativas de partilhar seu sofrimento e receber um gesto solidário, ao fim do expediente, em casa, conta finalmente a seu cavalo sobre a dolorosa perda do filho.

Em 2020, na vida real, a indiferença sobre a dor alheia parece nos envolver na mesma intensidade. Uma espécie de hierarquia da vida se faz presente, cujo valor é medido pelo que o filósofo camaronês Achille Mbembe denomina por necropolítica. No cenário pandêmico em que estamos todos inseridos, os exemplos de aversão ao luto alheio beiram a psicopatia. Como pode alguém, em sã consciência, tripudiar da dor dos outros? Afinal, o que é viver em sociedade?

O isolamento necessário para a manutenção da saúde coletiva soa como ofensa aos ouvidos de alguns cidadãos. Enquanto parte da sociedade luta em prol do bem comum, fazendo de tudo para salvar vidas de brasileiros e brasileiras, um outro tanto faz questão, por um lado, de se fantasiar com as cores nacionais, como se assim exaltassem uma incomparável brasilidade, e, por outro lado, exigem o direito à ferocidade, o direito de berrar, até mesmo para alguém de luto, como faz um personagem insensível no conto de Tchekhov: “Todos vamos morrer”.

No Brasil que não faz questão de acolher brasileiros e brasileiras num momento tão difícil, resistir é lutar contra a normalização da brutalidade. É o que fez, por exemplo, o taxista Marcio Antonio, no Rio. Ao ver uma pessoa desrespeitar a homenagem às vítimas da pandemia na praia de Copacabana, foi lá e recolocou as cruzes no lugar, exigindo respeito também pela morte do seu jovem filho, uma das vítimas da covid-19. Enquanto provocadores o adjetivavam com o intuito de o insultar, sem nenhuma empatia por sua dor, ele seguiu firme demonstrando o que todos nós precisamos, independente de vieses políticos: civilidade.

Uma chuva de indiferença contamina nosso solo. Vai passar. Outro mundo é possível. Acredito nisso. Ao mesmo tempo, na medida em que milhares de pessoas sofrem suas perdas por causa da pandemia, ao passo que o Chefe do Poder Executivo do País vive entre a negação e o eufemismo, quando não, o menosprezo à situação ou o delírio com a panaceia, penso o versículo de um canto da Igreja Russa usado como epígrafe no conto de Tchekhov ecoando na cabeça das pessoas: A quem confiar minha tristeza?

Evanilton Gonçalves (A crônica acima foi publicada no jornal A Tarde, no dia 07/07/2020.)

Imagem de Alexandra Haynak por Pixabay 

Assombros de si – três poemas de Adriano Eysen

NÁUSEAS

Há uma dor que galopa sem patas
em cada parte de mim.
Há uma ventania vista
nos arredores da alma,
tudo está além do sentido
nada é paisagem, nada me acalma.

Todas as multidões são ausência,
todos os homens vestem máscaras
neste teatro móvel da vida.
Falta-me céu, tudo é abismo, impaciência.

Há silêncio no deserto de mim
sou tantos entes partidos,
sem rosto, sem metafísica, sem fim.

Então, arrumar os fantasmas aqui dentro.
Partir cheio de náusea,
acotovelando lembranças de ontem
fincadas numa vontade de ser eu...
CONVERSA SOLITÁRIA

Vou partir para o poente
de mãos dadas com meus mortos
para reinventar verdades.

Vou-me embora sem fantasmas,
livre de multidões e deuses
para rever o menino que fui.

Parto montado no vento
rumo aos olhos azuis de minha mãe,
numa viagem dentro de mim mesmo.
ASSOMBROS DO POENTE

São quase desertas as casas.
Faltam uroras e nascentes nas janelas,
mas nos fios elétricos os pardais anunciam poentes...

São quase abissais os sonhos dos amantes.
Amar é uma forma de inventar cicatrizes
dentro da alma calada...

São de plumas as estrelas
que deslizam no corpo dessa cegueira de ser,
qualquer coisa perto do nada.

Como pude quereer todas as verdades
e ser mentira de mim mesmo?
Longe de tudo escrevo porque a vida é um golpe de navalha...
Adriano Eysen (Assombros do poente, Mondrongo: 2019)

O toque da delicadeza nos poemas de Áquila Emanuelle

IT’S ALL THAT MATTER
há aquela canção do caetano que fala exatamente sobre você embora
[oculte o teu nome escuto sempre atenta
sorriso canto de boca
deliro ao som da frase
que diz: "o mar nos olhos"
teus olhos, pois sim
e enxergo para além do verso
nas entrelinhas sobrepostas
das palavras
toda imensidão que há em ti
e tanto me inunda os olhos
a poesia
a vida
LOVE SOUND
i wanna be with you, eu disse
enquanto me aquecia no teu abraço-casa que penso eterno
me movo delicadamente e encosto meu ouvido na concha do teu peito
pronta a vigiar o sonzinho que
o amor faz aí dentro
o amor bate assim aceleradamente
ansioso em dizer o que sente
and then
repito sem pressa
i wanna be with you
aqui, aqui, aqui

POÉTICA
como as margens infindas de um poema
escrito em linhas transversais
embora distantes
nossas cidades
falam a mesma língua

A CIDADE
a vida aqui é sempre amena
a rotina se repete todos os dias
mesmo jeito
sob o sol quente das tardes
flamejantes
as crianças festejam a infância das horas
sem grandes estardalhaços
nas ruas disformes
casinhas enfileiradas
todas iguais
o rapaz da bicicleta atravessa a rua
buzinando pra entregar o pão
a menina corre triunfante
pés descalços
seu mundo comportando
eternidades
aqui há sempre alguém em silêncio
porta de casa
espiando a vida que corre
lado de fora
embora tenazes
ninguém dá-se ao luxo de sonhar
coisas grandes
a vida punge sem requintes
nesse lugar repleto
de esperas
MOLHAÇÃO
a previsão do tempo faz
promessa de chuva ainda
longínqua
joelhos prostrados
tenazes e vigilantes
os homens antecipam a mística
dos que tem pressa
e fazendo vênia aos céus
ecoam o canto das águas
deus como fiel escudeiro
exara a ordem divina:
março adentro
a força da chuva nos atravessa
rasgando o chão
fazendo da terra rios-meninos
com seus imensos e caudalosos
olhos d'águas
em tempos de chuva no sertão
esperanças resvaladas
entre céu e chão

Áquila Emanuelle